Enquanto no campo os produtores rurais brasileiros dão exemplos de cumprimento rigoroso da legislação ambiental, preservando reservas legais, cumprindo o Código Florestal e sendo cobrados por bancos e mercados internacionais em cada detalhe, a capital paraense mostra o retrato do improviso. Faltam hotéis, saneamento, transporte adequado e planejamento. O resultado: diárias de hospedagem que chegaram a valores de sete mil, quarenta mil e até quinze mil dólares em imóveis particulares. Um quarto simples, que custava cerca de cento e cinquenta reais, foi anunciado por quinze mil duzentos e sessenta e seis dólares a diária, um salto de quase dez mil por cento.
O abuso não passou despercebido. A ONU convocou reunião emergencial para discutir os preços surreais de hospedagem em Belém. O presidente da Áustria cancelou sua vinda à COP30 alegando restrições orçamentárias diante dos custos de viagem e estadia. Representantes de vinte e cinco países pediram ao governo brasileiro que reconsiderasse Belém como sede diante da precariedade e dos valores impraticáveis. Empresas, por sua vez, reduziram ou migraram suas agendas paralelas para São Paulo e Rio de Janeiro, temendo um evento caótico na Amazônia.
A resposta do poder público? Soluções improvisadas: cogitar hospedar delegações em navios de cruzeiro, motéis, salas de aula e barcos adaptados. Nada disso deixa legado. É remendo institucional para tapar um buraco criado por anos de abandono estrutural da Amazônia urbana.
Aqui está o contraste mais incômodo. O Brasil rural, tão criticado lá fora, cumpre regras ambientais rígidas e sustenta boa parte da economia com responsabilidade. Já o Estado brasileiro, que deveria dar o exemplo em sua própria casa, entrega uma cidade sem leitos, sem mobilidade e sem condições dignas para receber o mundo. O campo cumpre sua função socioambiental. A cidade, sob a gestão governamental, revela precariedade.
A COP30 deveria ser a oportunidade histórica de mostrar que a Amazônia pode unir desenvolvimento e preservação. Mas, se o evento for lembrado pelas diárias de quarenta mil reais, pela ausência de delegações e pelo improviso logístico, o que ficará marcado não será o compromisso ambiental, mas o descompasso entre discurso e realidade.
O mundo chegará a Belém. A pergunta é: vamos receber chefes de Estado em navios improvisados e diárias inacessíveis, ou vamos deixar registrado que o Brasil sabe cuidar da floresta e das pessoas que nela vivem?
O Brasil rural já mostrou que cumpre regras e entrega resultados. O desafio agora é o Estado mostrar que sabe fazer o mesmo. Se Belém fracassar na COP30, ficará provado que o problema nunca foi o produtor, mas sim a incapacidade governamental de cuidar da sua própria casa.
Hidekazu Souza de Oliveira é advogado especialista em direito agrário e ambiental
@hidekazu.adv