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Considerações sobre a penalidade de aposentaria compulsória com vencimentos proporcionais para os Magistrados condenados pelo CNJ

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Somente nos anos recentes, a partir da criação do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e da intensificação de suas funções institucionais, a sociedade brasileira passou a observar enfim a apuração mais transparente e eficaz de falhas de conduta praticadas por maus Magistrados, até então acobertados por um corporativismo ignóbil e ultrapassado, que acabava colocando sob injusta suspeição a credibilidade de todo o sistema judicial, maculando perante a opinião pública uma das mais honrosas e importantes carreiras do Direito, a Magistratura.

Por essa razão, a atuação do CNJ é digna dos mais efusivos elogios, notadamente porque possibilita ao Poder Judiciário promover sua depuração ética por meio de um processo mais célere que o judicial, afastando, pela via administrativa, membros cuja conduta se mostre incompatível com a moralidade, considerando que de um Magistrado se deve esperar sempre isenção, dignidade, abnegação e retidão no exercício de sua função pública.

Todavia, a atuação do CNJ trouxe, como efeito colateral, o dissabor/inconformismo popular de ver magistrados comprovadamente envolvidos em atos de corrupção sofrerem, como punição administrativa, o tal afastamento compulsório e definitivo com vencimentos proporcionais ao tempo de contribuição (aposentadoria). Não por acaso, essa forma esdrúxula de punição tem sido vista pelos cidadãos como “premiação por má conduta”, conforme repercutiram nacionalmente os casos do Ministro Paulo Medina (do Superior Tribunal de Justiça – STJ) e do Desembargador José Eduardo Carreira Alvim (ex-vice-presidente do Tribunal Regional Federal da 2ª Região), aposentados compulsoriamente pelo CNJ por terem sido condenados administrativamente pela venda de sentenças para a chamada máfia dos caça-níqueis.

Em âmbito local, repercutiu igualmente a aposentadoria compulsória com vencimentos proporcionais a que foi “condenada” a Desembargadora Willamara Leila (ex-presidente do Tribunal de Justiça do Tocantins – TJ/TO), que, por decisão unânime do Plenário do CNJ, foi punida administrativamente por manter “conduta incompatível com o exercício de suas funções”. [1]

Apesar do justificado inconformismo popular quanto a essa forma questionável de punição, cabe nota de que a aposentadoria compulsória com vencimentos proporcionais é a mais grave sanção administrativa prevista legalmente no Brasil para os magistrados, decorrendo de uma controvertida interpretação da Lei Complementar nº 35, de 14 de março de 1979 (a chamada Lei Orgânica da Magistratura Nacional – LOMAN), visto que a penalidade de demissão, embora também tenha sido prevista na referida lei, não foi recepcionada pela Constituição.

Por isso, a aposentadoria compulsória acaba sendo a penalidade mais severa aplicável a um Magistrado por meio de processo administrativo (o processo julgado no CNJ é um processo administrativo), de modo que a perda do cargo e de todas as prerrogativas a ele inerentes (inclusive dos vencimentos) só ocorre quando o Magistrado condenado administrativamente pelo CNJ também venha a ser condenado em definitivo em processo judicial.

Vê-se, com isso, que a sanção administrativa aplicada pelo CNJ nos casos dos magistrados acima mencionados (aposentadoria compulsória) está correta em termos legais, muito embora seja necessário ponderar que a lei que fundamenta tal penalidade (a LOMAN) foi editada ainda durante o período da ditadura militar e, na época, funcionava como uma necessária “blindagem” dos juízes, para que esses não sofressem pressões ou perseguições. Entretanto, em tempos de democracia plena, nada mais justifica postergar tal prerrogativa que agora se mostra anacrônica e imoral, convertendo-se em instrumento de inaceitáveis privilégios.

Afinal, o Estado Democrático de Direito e o Princípio Republicano, consagrados na Constituição brasileira, prescrevem que todos devem se submeter às leis do país, bem como garantem o tratamento isonômico (com o mesmo rigor) perante a justiça. Por conseguinte, em face desses princípios, não se afigura razoável que magistrados que cometam faltas funcionais e/ou deslizes éticos de natureza grave, inclusive a aviltante venda de sentenças, sejam punidos apenas com a aposentadoria compulsória, com vencimentos proporcionais ao tempo de serviço/contribuição.

Pelo exposto, para que ocorra a tão desejável depuração ética do serviço público,mais especificamente do Poder Judiciário, impõe-se a urgente alteração da Constituição Federal (via Emenda Constitucional) e da própria Lei Orgânica da Magistratura (o que depende do encaminhamento de proposta pelo STF) para que os magistrados punidos pelo CNJ com a aposentadoria compulsória não tenham mais direito a qualquer tipo de remuneração (que atualmente pode ser até integral no caso de contribuição por 35 anos ou mais), pois, de outro modo, as conquistas democráticas estarão em perigo, na medida em que o incrédulo cidadão passará a vislumbrar as premissas mais elementares que lhe fornecem a precisa noção de justiça (isonomia diante da lei e isenção do julgador) como garantias meramente “retóricas” ou como “adornos” inócuos do texto constitucional.

De todo modo, independentemente das alterações legislativas acima indicadas que, por certo, aprimorariam e tornariam mais justas as punições administrativas atribuídas aos maus magistrados, é preciso compreender que manter um magistrado ímprobo afastado de suas funções (ainda que agraciado por proventos parciais para permanecer no conforto de seu lar) é menos danoso ao interesse público e à cidadania do que deixá-lo “trabalhando” em seu gabinete, onde ele estaria vilipendiando a dignidade do cargo para obter benesses pessoais. Ou seja, na falta de um mecanismo mais justo e eficaz de punição ao infrator (o mau juiz), que pelo menos se proteja a vítima (o cidadão) do efeito pernicioso da sentença proferida por um magistrado desonrado e indigno da função que ocupa.


[1] Conforme o processo do CNJ, a Desembargadora Willamara Leila, quando presidiu o TJ/TO, cometeu os seguintes desvios de conduta: processamento irregular de precatórios; incompatibilidade entre seus rendimentos e a movimentação financeira; designação de magistrado em ofensa ao princípio do juiz natural; coação hierárquica; promoção pessoal por meio de propaganda irregular; irregularidades na gestão administrativa e apropriação de arma recolhida pela Corregedoria-Geral de Justiça do Tocantins.

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