Durante décadas, obras cruciais para o desenvolvimento do Brasil ficaram travadas em meio a uma burocracia asfixiante. Ferrovias planejadas para escoar a produção do agronegócio mofaram em gavetas. Rodovias federais, em estado precário, esperaram por anos o licenciamento para obras de duplicação ou manutenção. O resultado? Acidentes fatais, fretes mais caros, desperdício de produção e toneladas de CO² lançadas ao ar por caminhões parados em estradas engarrafadas. Agora, com a aprovação da Lei Geral do Licenciamento Ambiental (LGLA), o país dá um passo, ainda que pequeno, rumo à eficiência sem abrir mão da responsabilidade ambiental.
O projeto nasceu na Câmara dos Deputados, onde tramitou por quase duas décadas, e foi aprovado em 2021. Chegou ao Senado Federal, passou por novas negociações e alterações importantes, e agora, como houve mudanças no texto original, retorna à Câmara para nova deliberação. Após essa etapa, seguirá para sanção ou veto presidencial, concluindo o processo legislativo.
A nova lei promete dar fim ao labirinto de mais de 27 mil normativos ambientais dispersos que dificultavam até mesmo a atuação dos órgãos ambientais. Pela primeira vez, o Brasil caminha para um sistema unificado, claro e previsível de licenciamento, com prazos definidos e instrumentos compatíveis com o impacto de cada empreendimento.
Entre os principais avanços está a criação da Licença Ambiental por Adesão e Compromisso (LAC) — um modelo mais ágil, baseado em autodeclaração do empreendedor, válido para atividades de baixo e médio impacto. Para o agronegócio, essa mudança é transformadora. Produtores rurais, especialmente os de pequeno e médio porte, que hoje enfrentam entraves para regularizar silos, estradas vicinais, barragens e pequenas estruturas produtivas, terão mais agilidade e menos custo para operar de forma regular e segura.
A nova norma também abre caminho para acelerar obras estruturantes como ferrovias, portos e corredores logísticos. Gargalos históricos que penalizam o Brasil com um dos fretes mais caros do mundo. A morosidade no licenciamento de ferrovias, como ocorreu em trechos da Ferrovia Norte-Sul e da Ferrogrão, não é apenas um problema administrativo: ela encarece o transporte, aumenta o uso de caminhões e, por consequência, eleva as emissões de gases do efeito estufa.
Ou seja: quem mais sofre com o atraso ambiental, é o próprio meio ambiente.
Outro ponto de destaque é a criação da Licença Ambiental Especial (LAE), que permitirá ao governo priorizar empreendimentos estratégicos — como obras de infraestrutura, energias renováveis e até saneamento básico — com análise mais rápida e menos etapas burocráticas, mas sempre com base em critérios técnicos e controle institucional.
A segurança jurídica gerada pela nova lei não é uma carta branca para degradação, como alguns críticos sugerem. Pelo contrário: amplia-se a responsabilidade do empreendedor, que, ao assumir o compromisso ambiental por meio da LAC, estará sujeito a sanções mais severas em caso de fraude ou omissão. Aliás, a nova norma aumenta a pena para crimes ambientais praticados sem licença, o que sinaliza um equilíbrio entre simplificação e rigidez na fiscalização.
No fundo, o que a LGLA traz é uma modernização necessária. Um país com vocação agroambiental como o Brasil não pode permitir que licenças levem sete, oito ou até dez anos para serem emitidas. Enquanto isso, o produtor perde competitividade, o investidor desiste, o caminhão para, o preço do alimento sobe e o meio ambiente segue sendo impactado, só que sem controle.
Em um cenário de disputa global por alimentos, energia limpa e sustentabilidade, o Brasil precisa ter o licenciamento como um instrumento de gestão, e não como uma armadilha burocrática. E o agro, que sempre foi protagonista em produtividade e inovação, pode agora ser também protagonista de uma nova era de desenvolvimento com responsabilidade.
Hidekazu Souza de Oliveira é advogado especialista em direito agrário e ambiental
@hidekazu.adv
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