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Coluna “Opinião com Fundamento” Entre Algoritmos e Justiça: a Advocacia que Não Pode Ser Reduzida a Código

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Tecnologia pode acelerar processos, mas só a advocacia pode resgatar a cidadania.

 

Por Roger Sousa Kühn, Advogado, Doutor em Ciências Jurídicas e Sociais

 

Vivemos em um tempo curioso. Enquanto as ruas pedem por justiça célere, acessível e humana, o Direito insiste em se esconder atrás de formalismos que já não dialogam com a realidade. Nesse cenário, surgem as legaltechs, startups que prometem revolucionar a advocacia, automatizar tarefas e democratizar o acesso à informação jurídica. Mas será que a advocacia brasileira, que um dia foi protagonista da cidadania, está preparada para não ser engolida por essa onda?

A ilusão da eficiência sem alma

É inegável que a tecnologia carrega um potencial transformador. Plataformas que monitoram processos em tempo real, softwares que redigem contratos, inteligência artificial que identifica precedentes em segundos. Isso tudo é avanço. Mas aqui cabe uma provocação: o que é da essência da advocacia pode ser reduzido a um algoritmo?

A defesa da liberdade, a escuta de uma vítima, a coragem de enfrentar um tribunal — esses atos de humanidade não podem ser terceirizados a uma máquina. A advocacia sem alma é apenas burocracia acelerada.

Quando a Ordem se cala e a inovação grita

A OAB, que deveria liderar o debate sobre tecnologia e ética, se mantém numa postura passiva, sempre reagindo ao inevitável, raramente antecipando as transformações. Enquanto isso, instituições independentes têm se mostrado faróis no meio da névoa:

  • A AADA – Associação de Apoio e Desenvolvimento da Advocacia de Araguaína e Região, com sua energia de integração e defesa prática da classe;
  • O IAT – Instituto da Advocacia do Tocantins, que projeta debates consistentes sobre o futuro da advocacia no Estado;
  • A ATAT – Associação Tocantinense da Advocacia Trabalhista, atuante em um campo onde a tecnologia já disputa espaço com a própria dignidade do trabalho humano;
  • Os núcleos da Abracrim e do IBDFAM, que, mesmo com recursos limitados, não se furtam a levantar bandeiras em defesa da cidadania.

Essas entidades provam que a advocacia ainda respira. Enquanto a estrutura nacional se perde em disputas internas, são as vozes regionais que têm assumido a resistência e lembrado à sociedade que a advocacia existe para servi-la.

O advogado: elo entre redes rápidas e instituições lentas

O professor Roberto Aguiar já provocava: vivemos em uma sociedade de redes rápidas, mas continuamos presos a instituições lentas. Essa tensão é ainda mais visível na advocacia. O mundo caminha em bytes, mas a Justiça se arrasta em carimbos. É nesse vácuo que as legaltechs prosperam. E é aqui que o advogado precisa se recolocar: não como um mero operador de sistemas digitais, mas como o elo crítico entre a tecnologia acelerada e a proteção da dignidade humana.

Protagonismo ou obsolescência

A advocacia tem duas escolhas: ou retoma o protagonismo da cidadania — usando a tecnologia como ferramenta, mas não como substituta — ou se arrisca a se tornar obsoleta, reduzida a relatórios automáticos que qualquer empresa de software pode entregar.

Ser protagonista não é estar na vitrine das redes sociais, mas ousar defender a sociedade quando todos os outros se calam. É este chamado que precisa ecoar da advocacia brasileira.

O Desafio que Resta

Não se trata de rejeitar a inovação, mas de resgatar a missão. O advogado que aceitar a condição de mero apertador de botões perderá sua razão de existir. Mas aquele que souber usar a tecnologia como espada e escudo, mantendo-se fiel à defesa da cidadania, será indispensável — não só ao processo, mas à própria democracia.

E talvez, ironicamente, sejam justamente as instituições independentes do Tocantins — AADA, IAT, ATAT, Abracrim e IBDFAM — que estejam apontando o caminho de como a advocacia pode, mais uma vez, voltar a falar pelo povo.

 

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