Coluna “Opinião com Fundamento”: A Toga e a Tribuna: Por que a Advocacia Precisa Voltar a Falar pelo Povo
Por Roger Sousa Kühn – Advogado, Doutor em Ciências Jurídicas e Sociais
No Brasil, o advogado é mais do que um profissional técnico. É, por força da Constituição, indispensável à administração da Justiça. Mas, na prática, o papel social e político da advocacia tem sido enfraquecido ao ponto de quase se tornar coadjuvante no debate nacional. A toga, que simboliza a defesa intransigente das liberdades e da cidadania, tem se mantido cada vez mais distante da tribuna onde ecoam as vozes que realmente moldam o destino do país.
Não é um desabafo isolado. É a constatação de que a advocacia brasileira precisa urgentemente resgatar seu protagonismo histórico. Deixar de falar apenas para si e voltar a falar pelo povo.
OAB: gigante adormecido
A Ordem dos Advogados do Brasil nasceu com a missão de proteger as prerrogativas e de ser uma das guardiãs da democracia. No entanto, nos últimos anos, o que se vê é uma instituição que, salvo raras exceções, parece mais preocupada com pautas internas e disputas de influência do que com a defesa concreta da cidadania.
O silêncio ou a timidez diante de questões nacionais graves não condizem com a tradição de uma entidade que já foi protagonista em momentos decisivos da história republicana.
O exemplo das instituições independentes
Enquanto a OAB hesita, instituições criadas por advogados, de forma independente e com recursos limitados, vêm assumindo, na prática, um papel que deveria ser também da Ordem: a defesa firme e despolitizada da advocacia e da sociedade.
No Tocantins, temos exemplos notáveis:
AADA – Associação de Apoio e Desenvolvimento da Advocacia de Araguaína e Região, que promove integração, formação e mobilização da classe em defesa de causas coletivas.
IAT – Instituto da Advocacia do Tocantins, com atuação jurídica e social estratégica.
ATAT – Associação Tocantinense da Advocacia Trabalhista, que luta pela efetividade dos direitos sociais e pela dignidade do trabalho.
Núcleos estaduais da Abracrim e do IBDFAM, que, cada um em sua área (Direito Penal e Direito de Família), têm se colocado como linhas de frente na proteção de direitos, mesmo com estrutura reduzida.
Essas instituições provam que, mesmo sem o peso político e financeiro da OAB, é possível fazer muito — desde que haja coragem e compromisso com algo maior do que interesses pessoais.
Advocacia como instrumento de cidadania
A advocacia não pode se limitar à defesa individual de clientes.
Em um país onde a desigualdade, a violência e o desrespeito às leis corroem o tecido social, o advogado precisa ser porta-voz das demandas coletivas, catalisador de mudanças e escudo contra retrocessos.
Isso significa tomar posição diante de violações de direitos, denunciar abusos de poder, defender a liberdade de imprensa, exigir transparência e cobrar políticas públicas eficientes.
Significa, em suma, retomar a função de guardiã da democracia.
O chamado à ação
Está passando da hora de a advocacia brasileira abandonar a zona de conforto.
Não podemos deixar que a imagem da nossa profissão se restrinja a disputas internas, cargos e vaidades.
Se a OAB não liderar este movimento, que pelo menos se inspire e se una aos esforços das instituições independentes que já estão no campo de batalha.
A toga e a tribuna não podem estar separadas. Uma sem a outra é apenas símbolo vazio. É tempo de reconciliação — não para o interesse de poucos, mas para o bem de todos.
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