O arcabouço jurídico internacional encarnado na Lei Global Magnitsky — idealizada para sancionar práticas graves de violação de direitos humanos e corrupção — impõe às instituições financeiras que atuam globalmente uma política de compliance. A negligência a essa norma, longe de ser um problema distante, pode resultar em consequências devastadoras para a economia brasileira, especialmente para o agronegócio.
Relatórios da imprensa financeira internacional indicam que grandes bancos brasileiros, incluindo o Banco do Brasil, receberam questionamentos formais do Office of Foreign Assets Control (OFAC), dos EUA, acerca das medidas adotadas para cumprir a Magnitsky, especialmente após sanções dirigidas a um ministro do STF.
A situação fica ainda mais delicada, considerando que os ministros do Supremo recebem seus salários pelo Banco do Brasil. Reportagens da imprensa apontam que o banco teria, inclusive, oferecido um cartão de crédito nacional ao ministro sancionado. O problema é que a Lei Magnitsky é clara: qualquer banco que faça operações em dólar ou dependa do sistema financeiro americano não pode prestar nenhum tipo de serviço financeiro a pessoas incluídas na lista de sanções. Ou seja, mesmo que o cartão tenha bandeira nacional, o risco não desaparece. A instituição que mantém a conta e oferece o serviço, continua sujeita à lei internacional e pode ser alvo de punições severas, como multas bilionárias ou até restrições de acesso ao sistema financeiro global.
Essa dinâmica expõe uma realidade geopolítica inegável: não é de hoje que os Estados Unidos se posicionam como o “xerife do mundo”, uma postura sustentada por seu inegável poderio econômico e bélico. Concorde-se ou não com a legitimidade dessa posição, ignorar suas regras é uma aposta de altíssimo risco. É uma demonstração pragmática de que, nas relações internacionais, a prudência manda obedecer a quem tem o poder de fiscalizar. Desafiar esse sistema significa imiscuir o Brasil em uma crise com potencial para paralisar o agronegócio e arrastar todo o sistema financeiro.
Para o produtor rural, o risco é direto e palpável. Uma sanção ao principal agente financeiro do setor pode significar a interrupção súbita de linhas de crédito rural, prejuízos imensuráveis aos acionistas, o bloqueio de pagamentos de exportações em bancos correspondentes e um aumento expressivo no custo dos financiamentos. O produtor, que já enfrenta um cenário adverso, se tornaria refém de uma crise institucional que não criou.
É imperativo que, o Banco do Brasil, como financiador central do agro, reforce seus protocolos de due diligence com total transparência. Ao produtor rural, por meio de suas cooperativas e associações, cabe exigir clareza sobre as políticas de compliance e buscar a diversificação de suas fontes de financiamento.
Ao Judiciário e ao Legislativo cabe a tarefa de assegurar que a governança das instituições financeiras públicas seja sólida, transparente e imune a interferências que coloquem em risco não apenas a credibilidade internacional do país, mas também o bolso do cidadão e a própria segurança alimentar global. O Brasil não pode se dar ao luxo de brincar com a estabilidade de seu setor mais estratégico. É desejável que, no futuro, a corrupção e a fragilidade institucional cedam espaço para um Brasil capaz de projetar-se como potência econômica e, quem sabe, até bélica, de modo a não se dobrar aos caprichos de outras nações. Porém, até lá, esse ainda parece ser um caminho longo, árduo e distante da nossa realidade.
Hidekazu Souza de Oliveira é advogado especialista em direito agrário e ambiental
@hidekazu.adv
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