Supremo decide que lei de autonomia do BC é constitucional

Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu, nesta quinta-feira, 26, que a lei que estabeleceu autonomia do Banco Central é constitucional e deve ser mantida. Foram oito votos a favor de manter as novas regras, que buscam blindar a autoridade monetária de interferências políticas, e dois contra

Pela constitucionalidade, votaram os ministros Luís Roberto Barroso, Dias Toffoli, Nunes Marques, Alexandre de Moraes, Edson Fachin, Cármen Lúcia e Gilmar Mendes, além do presidente da Corte, Luiz Fux. Eles foram contrários à ação proposta pelo PT e pelo PSol que buscava derrubar a lei, por considerá-la inconstitucional por vício de iniciativa, quando a lei tem origem diferente do que prevê a Constituição.

A autonomia do BC foi aprovada pelo Congresso e sancionada em fevereiro pelo presidente Jair Bolsonaro. Os partidos alegam que a proposta, por se tratar de mudança na organização da administração pública, não poderia ter sido de iniciativa do Senado, como foi, mas do presidente da República.

A maioria dos ministros não concordou com a argumentação. O ministro Luís Roberto Barroso, que votou na quarta-feira, 25, foi o primeiro a ir na direção contrária à da ação. Para ele, não houve vício de iniciativa, e a lei não trata de nenhuma situação que exija que o projeto seja apresentado pelo Executivo. 

“Nos sistemas presidencialistas, a regra geral é que quem legisla é o Poder Legislativo. A Constituição brasileira prevê algumas hipóteses de iniciativa privativa do presidente da República, mas essa é a exceção, e, precisamente por ser exceção, deve ser interpretada essa norma de maneira estrita”, sustentou Barroso.

A lei em questão, segundo Barroso, não se enquadra nas exceções. “Não estamos tratando nem de regime jurídico de servidores nem tampouco estamos tratando da criação ou extinção de ministério ou de órgão publico”, disse. 

Barroso lembrou que Bolsonaro enviou mensagem ao Congresso, defendendo aprovação no mesmo teor do projeto. “Se houvesse necessidade de iniciativa presidencial, que eu procurei demonstrar que não havia, ela foi suprida pelo envio de uma mensagem do presidente da República com o teor praticamente idêntico ao que veio a ser aprovado”, apontou.

O ministro Dias Toffoli acompanhou integralmente o voto de Barroso, nesta quinta-feira. Ele disse não ver nenhuma inconstitucionalidade do ponto de vista formal. Os dispositivos tratados na lei, na visão dele, eram de competência dos parlamentares. “Está absolutamente nas mãos do Congresso Nacional”, disse.

Em seguida, o ministro Nunes Marques também votou a favor da constitucionalidade da autonomia do BC. Durante o voto, ele afirmou que a medida “é requisito essencial para a confiança nas relações internacionais” e é um “forte indicativo de transparência, responsabilidade e confiança”. 

No voto no mesmo sentido, o ministro Alexandre de Moraes ressaltou que a lei aprovada é “praticamente idêntica” à proposta por Bolsonaro. A ministra Cármen Lúcia concordou com o entendimento dele. Para ela, o apensamento do projeto do governo ao do Senado “fez sanar qualquer vício de iniciativa”. 

“A lei complementar não está viciada formalmente, não contraria a Constituição, porque a apresentação do ato do presidente da República supriu devidamente a exigência constitucional, e não vislumbro qualquer inconstitucionalidade material”, afirmou Cármen Lúcia.

O ministro Edson Fachin, ao votar, disse não ter dúvidas de que a iniciativa da matéria pertence privativamente ao presidente da República, mas também destacou que o projeto do Executivo foi apensado ao de origem no Senado, o que respeita as exigências constitucionais.

“A decisão de apensamento levada a cabo pela Câmara dos Deputados indicou identidade entre o projeto 19, de origem no Senado, e o projeto 112, de origem no Poder Executivo. Portanto, o que houve foi um prosseguimento conjunto das propostas, com a prevalência do PL 19”, argumentou Fachin.

Votos vencidos

Só votaram a favor do entendimento do PT e do PSol Ricardo Lewandowski, relator do caso, e Rosa Weber. “A questão é saber se, por iniciativa exclusivamente parlamentar, seria possível subtrair do presidente da República o controle de algum órgão da administração pública federal, sem que tal fosse feito por projeto de lei com origem no Poder Executivo”, resumiu.

Lewandoswki deixou claro não fazer juízo de valor sobre as novas regras, se são positivas ou não, mas ressaltou que a lei retira o controle político do Banco Central e que isso foi feito por iniciativa parlamentar. Além disso, a discussão começou pelo Senado, quando, nesses casos, deve ter início na Câmara, acrescentou.

Lewandowski considera que as mudanças vão além de uma simples remodelação. A lei estabeleceu mandatos fixos para dirigentes, que só poderão deixar o cargo por motivos “completamente alheios à vontade do presidente”, e acabou com a vinculação do BC ao Ministério da Economia, ressaltou. Apesar da longa argumentação, foi voto vencido. 

Ação

“É evidente que o Congresso Nacional tramitou e fez aprovar projeto de lei de senador de República sobre matéria própria e indelegável do Presidente da República”, diz a ação do PT e do PSol. Além do vício de iniciativa, os partidos apontam que a lei resulta em “descoordenação” das políticas monetária e fiscal, “ocasionando um descasamento da política econômica”.

O procurador-geral da República, Augusto Aras, também defendeu a derrubada da autonomia do BC. Em parecer enviado ao STF, ele reforçou os problemas técnicos na proposta, que a tornariam inconstitucionais. “O ponto central da questão é o Senado Federal não ter deliberado sobre o projeto de iniciativa do presidente da República”, afirma.

Os partidos dizem que, se a lei for mantida, haverá “consequências irreparáveis”. Na ação, eles sustentam que “não se pode pensar em um Banco Central com objetivos distintos das políticas do governo federal, quando mais em um país em desenvolvimento e repleto de demandas sociais, políticas e econômicas prementes”.

A Advocacia-Geral da União (AGU) discordou do posicionamento das legendas e afirmou que elas estão “irresignadas contra a liberdade de conformação legislativa”. O objetivo da ação, segundo a AGU, é “fazer prevalecer uma posição política diversa daquela que preponderou após o debate parlamentar”.

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