Contando exatamente 1912 respiradores hospitalares para uma população de 19,5 milhões de habitantes, o Chile entrou em modo de guerra para evitar que seu sistema de saúde fosse engolido pela pandemia de coronavírus. A tática de aplicar testes massivamente, mais de 15.000 por dia, vem garantindo ao país uma das menores taxas de mortalidade pela doença na América do Sul, cerca de 25 mortes por milhão de habitantes. Na mesma métrica, o Brasil registra 77 mortes por milhão de habitantes, três vezes mais que o país vizinho.
Até o dia 18 de maio, de acordo com os dados mais recentes divulgados pela secretaria de saúde pública chilena, o país contava 46.059 infectados e 478 mortes. Para efeito de comparação, a Argentina, um dos primeiros países latino-americanos a adotar medidas severas para controlar a propagação do vírus, conta hoje com pouco mais de 8.068 infectados e 373 mortes, número de óbitos próximo ao chileno, que, no entanto, tem 5 vezes mais infectados. Ainda assim, proporcionalmente, a Argentina tem 8 mortes por milhão de habitantes, o melhor cenário da região.
Para proteger seu calcanhar de Aquiles, a pouquíssima oferta de respiradores hospitalares, o Chile seguiu o bom exemplo de países como a Nova Zelândia: adotou medidas de isolamento social muito cedo e entendeu a importância dos testes em massa. No 18 de março, quando o país contava menos de 250 infectados, o presidente Sebástian Piñera declarou estado de exceção por catástrofe em todo o território chileno. Desde então, o país já realizou mais de 380.000 testes, cerca de 19.952 por milhão de habitantes, segundo a base de dados worldometers.
Segundo o Ministério da Saúde do Chile, o país conta hoje com 1912 respiradores para toda a população. No Brasil, apenas para o enfrentamento da crise de coronavírus, o governo federal prometeu entregar 14.100 novos respiradores além dos já existentes. Até agora, no entanto, apenas 6% do montante, 2.600 ventiladores, foram entregues.
O alto percentual de testes que o país vem realizando é a principal pista de como o Chile está conseguindo manter uma taxa de mortalidade bem menor do que a dos países vizinhos ─ mesmo que, nos últimos dias, o aumento no número de infecções e mortes tenha acendido sinal de alerta por parte das autoridades locais.
Em relação ao Brasil, uma das maiores vantagens do país vizinho é o tamanho de seu território e a concentração de seus casos. Enquanto por aqui a pandemia se divide em três grandes focos ─ São Paulo, Rio de Janeiro e Amazonas ─, no Chile, 70% de todas as infecções estão na capital Santiago.
Mesmo com casos mais concentrados, o país é um exemplo na realização de testes. Em relação ao Brasil, que realiza 3,462 exames por milhão de habitantes, o Chile testa pelo menos 5 vezes mais. A disparidade dos números é também um dos maiores indicadores sobre a diferença de moralidade nos dois países. Embora em números absolutos o Brasil ocupe a 13° posição no ranking de exames realizados, cerca de 735.000, proporcionalmente somos o 110° em testes por milhão de habitantes.
Batalha de Santiago
No balanço mais recente da pandemia, o governo chileno registrou 2.278 novos casos e 28 mortes, números que vem que aumentando nos últimos dias. Segundo as autoridades locais, além da escassez de respiradores, o nível de ocupação total dos hospitais do país está em 81%. Em Santiago, que concentra mais da metade de todas as infecções do país, 91% dos leitos já estão sendo utilizados.
Para evitar um colapso no sistema de saúde de Santiago, desde às 22 horas locais da última sexta-feira a metrópole entrou em lockdown, adotando as medidas mais rígidas desde o início da pandemia. Um efetivo de 14 mil soldados está garantindo o cumprimento de um toque de recolher que vai das 22h às 5h. O governo local estima que o confinamento obrigatório impactará 70% das atividades da região. Os cidadãos que precisam sair de casa para trabalhar ou fazer outras atividades, como comprar alimentos, são obrigados a apresentar uma licença individual de circulação à polícia.
Além de evitar que novos grandes focos da doença apareçam fora de Santiago, a ideia do governo local é frear o número de novas contaminações. O presidente Sebastián Piñera disse que o país precisará do “compromisso de cada chileno” para enfrentar a crise. O Ministro da Saúde, Jaime Mañalich, disse que “se a Batalha de Santiago não for levada a sério, a guerra contra o Covid-19 será perdida”.
Embora fique atrás apenas do Brasil e do Peru em número de infectados, por ora, as medidas adotadas pelo Chile vem conseguindo garantir uma taxa de mortalidade três vezes menor do que nos países vizinhos.