A fila de cidadãos à espera de serem incluídos no Bolsa Família voltou a crescer, e se aproxima de 1 milhão de famílias. São exatamente 999.673 famílias que atendem aos critérios para receber o benefício, estão no cadastro único do governo mas não foram incluídas no programa. Os números foram obtidos pelo O Globo por meio da Lei de Acesso à Informação.
Os dados revelam um contingente de famílias aptas a ser inseridas no programa, num momento em que o governo descarta prorrogar o auxílio emergencial e aposta na manutenção do Bolsa Família a partir de janeiro de 2021, enquanto um novo programa social não é aprovado.
Mesmo que essas pessoas estejam recebendo temporariamente o auxílio emergencial — hoje em 300 reais e que vai até somente este mês —, não há garantias de que essas famílias passarão a integrar o Bolsa Família a partir de 2021.
Nesta semana, a ala política do governo descartou criar um novo programa social ainda neste ano, e só vai discutir o assunto a partir de fevereiro. A situação se soma ao aumento do desemprego registrado nos últimos meses. De acordo com o IBGE, o número de desempregados no país deu um salto de 36% entre maio e outubro.
O histórico do Bolsa Família disponibilizado pelo Ministério da Cidadania revela que o pico da fila durante o governo Jair Bolsonaro foi registrado em março de 2020, quando 1,655 milhão de famílias aguardavam para ser incluídas no programa. Esse número caiu para 433.000 no mês seguinte, mas voltou a crescer até setembro.
O mês de setembro é o último disponível porque, naquele mês, uma portaria do Ministério da Cidadania suspendeu as “ações de administração de benefícios”. Ou seja, novas pessoas deixaram de ser incluídas no Cadastro Único para programas sociais do governo e os técnicos do programa também deixaram de analisar quais famílias estão aptas ao benefício. Portanto, o tamanho da fila pode ser ainda maior.
Concentração do Sudeste e Nordeste
A fila está concentrada nas regiões Sudeste e Nordeste. Apenas o estado de São Paulo tem 18,95% das famílias nessa situação.
Atualmente, 14,274 milhões fazem parte do Bolsa Família. Em 2020, o programa tem um orçamento de 32,5 bilhões de reais, que subirá para 34,8 bilhões no próximo ano.
A chamada fila do Bolsa Família ocorre durante o processo de habilitação das famílias, em que elas são identificadas aptas a receber o programa. São habilitadas as famílias registradas no Cadastro Único, com informações atualizadas nos últimos dois anos e qualificadas no processo de averiguação cadastral, e que possuam perfil de renda e composição familiar que as tornem elegíveis para o benefício.
Atualmente, as famílias devem ter renda familiar per capita de até 89,00 reais mensais; ou renda per capita entre 89,01 e 178,00 reais mensais desde que tenham crianças ou adolescentes de zero a 17 anos em sua composição.
O processo de seleção define, com base nas famílias habilitadas ao programa, a quantidade de famílias que terão o benefício concedido, além de sua ordem de entrada no programa. A definição do número de famílias efetivamente atendidas pelo programa depende do tamanho do orçamento do programa. Quando o orçamento é menor do que o número de famílias habilitadas, o programa passa a registrar uma fila.
Na resposta ao O Globo por meio da LAI, o Ministério da Cidadania disse que os benefícios financeiros do programa recebidos após a família passar pelos procedimentos de habilitação, seleção e concessão, “não representam um direito da família que preenche os requisitos”.
A pasta diz que a lei que criou o programa prevê que o “Poder Executivo deverá compatibilizar a quantidade de beneficiários e de benefícios financeiros específicos do programa Bolsa Família com as dotações orçamentárias existentes.”
Ou seja, estar habilitado não dá direito automático ao benefício, de acordo com o ministério. Isso é diferente do que ocorre na concessão no Benefício de Prestação Continuada (BPC) — pago a idosos e pessoas com deficiência. Nele, os cidadãos que preenchem os requisitos conquistam o direito ao benefício. No caso do Bolsa Família a legislação não determina que o governo federal deva conceder o benefício às famílias habilitadas.
“A capacidade de atendimento do programa deve obedecer, necessariamente, ao orçamento disponível para o ano, segundo a Lei Orçamentária Anual”, disse a pasta.