No dia em que o bate-boca político deu lugar à vida real na Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Covid, depoimentos de quem perdeu parentes pela doença provocaram emoção na sala de sessões do Senado onde durante seis meses opositores do governo e aliados do presidente Jair Bolsonaro se engalfinharam. Por três horas e meia, nesta segunda-feira, 18, senadores ouviram relatos dramáticos de homens e mulheres que viveram uma guerra, mas foram derrotados pelo coronavírus.
Os depoimentos demonstraram a dor da impotência diante da doença que já tirou mais de 600 mil vidas no País. Em comum, todos apontaram a responsabilidade do governo Bolsonaro pela falta de vacinas, que levou o Brasil a uma situação de descontrole no combate à pandemia.
Giovanna Gomes Mendes da Silva, estudante de 19 anos, perdeu o pai e a mãe em apenas duas semanas e teve de virar chefe de família, cuidando da irmã oito anos mais nova que ela. “Eu, meus pais e minha irmã éramos muito unidos. Quando meus pais faleceram, a gente perdeu as pessoas que a gente mais amava. A gente não perdeu só os pais, a gente perdeu uma vida. Uma vida de alegria”, disse ela, com a voz embargada.
Ao ouvir Giovanna contar que pediu a guarda da irmã, após a morte dos pais, o intérprete de Libras (Língua Brasileira de Sinais), que fazia a tradução daquele depoimento, chorou e foi substituído por um colega.
O taxista Márcio Antônio do Nascimento Silva, que perdeu um filho para o coronavírus, afirmou ter sentido “no coração” ao ouvir o presidente Jair Bolsonaro perguntar “E daí? Quer que eu faça o quê?”, em abril do ano passado, quando as mortes por covid haviam ultrapassado a marca de 5 mil.
“Eu escutei lá no meu coração: ‘E daí que seu filho morreu?’. Isso me gerou muita raiva, muito ódio. Isso me fez muito mal”, desabafou Márcio Antônio. “Eu daria a minha vida para o meu filho ter chance de ter se vacinado. Não tinha perspectiva de vacina ainda. Sabe, não tinha ainda máscara”, completou o taxista, que também viu a irmã morrer de covid.
A exemplo de Márcio Antônio, a enfermeira Mayra Pires Lima, do Amazonas, perdeu a irmã para a doença. À CPI, Mayra lembrou o drama vivido com a escassez de equipamentos durante a crise de oxigênio em Manaus, em janeiro deste ano. “Eu tinha um grande sonho de ajudar as grandes calamidades, conhecer outros países que precisam de ajuda e talvez atender pacientes em situações de guerra”, afirmou. “Hoje eu falo que eu vivi uma guerra, porque atendi pacientes muitas vezes sem proteção nenhuma, assim como os meus colegas da maternidade”.