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Coronavírus: sem trabalho de estrangeiros, Alemanha convoca voluntários para colheitas

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O início da primavera traz à Alemanha cerca de 300 mil trabalhadores sazonais vindo de países do Leste Europeu para auxiliar agricultores locais na colheita de diversas culturas. A temporada começa com o aspargo, que ocupa grande parte das terras cultivadas no país, aproximadamente 23 mil hectares, o equivalente a quase um quinto da área de cultivo de legumes ao ar livre.

Neste ano, porém, a pandemia do novo coronavírus trouxe um desafio à agricultura alemã, pois o fechamento das fronteiras em vários países no continente impediu o deslocamento desta mão de obra vinda do exterior.

“Os impactos na agricultura, atualmente, não são tão dramáticos quanto em outros setores e dependem das restrições aplicadas no momento”, afirmou à BBC News Brasil Sebastian Lakner, professor de agroeconomia na Universidade de Rostock. “O principal problema é a mão de obra sazonal, que corresponde a 10% das horas de trabalho agrícola. Ainda não se sabe quanto por cento desta carga será compensada com trabalhadores alemães.”

Além do aspargo, as colheitas de morango, maçã, pera, diversos tipos de legumes e de uva, para a produção de vinho, dependem de trabalhadores sazonais. Eles também representam grande parte da mão de obra em abatedouros de porcos no país.

Para a temporada de colheitas, que começa em abril e se estende até final de setembro, agricultores alemães contam com trabalhadores que vem, sobretudo, da Polônia e Romênia, geralmente de ônibus, e costumam passar de três a quatro meses trabalhando em campos do país.

Com as fronteiras fechadas, ônibus trazendo esses grupos não podem mais trafegar por países que fazem parte da rota até a Alemanha. O secretário-geral interino da Associação de Agricultores Alemães (DBV), Udo Hemmerling, contou que, pouco antes do próprio governo alemão anunciar o fechamento de suas fronteiras, alguns trabalhadores foram trazidos da Romênia em voos fretados, mas agora, nem esse tipo transporte é possível.

“Pare evitar a diminuição no abastecimento de frutas e legumes, é preciso ser encontrada em breve uma solução para a interrupção da circulação dos trabalhadores sazonais. Nós pedimos a abertura das fronteiras para esse grupo. As viagens destes trabalhadores, pelo menos em parte, devem ser novamente permitidas”, disse Hemmerling à BBC Brasil.

Sem trabalhadores para a colheita, pode haver uma redução considerável na oferta de determinados produtos em mercados, e, com isso, um aumento de preços. Mas para Lakner, a maior preocupação é com o fornecimento de produtos essenciais a uma dieta saudável.

“É possível dispensar aspargos e morangos se o preço aumentar, mas legumes e saladas são fundamentais para uma alimentação saudável e essas culturas dependem destes trabalhadores sazonais”, acrescentou o especialista.

Soluções internas

Enquanto o impasse do fechamento de fronteiras e da mobilidade de mão de obra sazonal não é solucionado, o Ministério da Alimentação e Agricultura da Alemanha vem buscando alternativas para diminuir os impactos da crise da pandemia da covid-19 no setor.

Entre as iniciativas está o lançamento da plataforma “Das Land hilft” (O país ajuda), que liga agricultores a voluntários que desejam trabalhar no campo. Assim estudantes, autônomos e pessoas que estão sem ocupação no momento devido às medidas restritivas de isolamento social impostas no país podem contribuir para o funcionamento do setor agrícola e ainda receber por isso.

“Qualquer pessoa que pode e quer ajudar na agricultura deve, portanto, fazê-lo e também deve poder ganhar dinheiro com isso. É uma situação na qual todos ganham”, destacou a ministra alemã da Alimentação e Agricultura, Julia Klöckner, no lançamento da plataforma, em meados em março.

De acordo com uma porta-voz do ministério, até 31/03, aproximadamente 40 mil voluntários se inscreveram na plataforma e alguns deles já começaram a trabalhar no campo.

A ministra da Agricultura também vem defendendo a flexibilização das leis de migração, para que requerentes de refúgio, que pela legislação alemã não têm permissão de trabalhar, possam ocupar essas vagas, se tiverem interesse, durante esse período de crise.

Na quinta-feira (02/04), Klöckner anunciou que o governo alemão pretende liberar a entrada de 80 mil trabalhadores sazonais até o final de maio. Eles deverão passar por exames, e se houver suspeita de infecção não poderão viajar para a Alemanha. Os grupos serão transportados por via aérea e devem ficar em quarentena por 14 dias ao chegar no país. Poderão, no entanto, trabalhar nesse intervalo, mas sem ter contato com outros funcionários.

Para diminuir os impactos econômicos da crise para os agricultores, o grupo foi incluído no pacote de ajuda emergência de 50 bilhões de euros (R$ 280 bilhões) destinado a pequenas empresas e autônomos. Eles podem receber um auxílio financeiro de até 15 mil euros (R$ 84 mil) para cobrir as despesas.

O ministério também aumentou de 70 dias para 115 dias o período no qual trabalhadores sazonais podem atuar no país sem precisar contribuir para o sistema de segurança social alemão. Desta maneira, aqueles que já chegaram à Alemanha poderão continuar trabalhando no campo por um período maior. A flexibilização fica em vigor até 31 de outubro.

Problema europeu

Hemmerling lembrou ainda que a mão de obra sazonal estrangeira não é usada somente por agricultores alemães. “Esse é um problema que atinge toda a Europa. A agricultura em diversos países europeus, entre eles, Holanda, Itália e Espanha, depende destes trabalhadores, por isso, é preciso encontrar uma solução para todo o bloco”, acrescentou.

A Comissão Europeia apresentou na segunda-feira uma sugestão de diretrizes para os países do bloco que garantam a livre circulação de trabalhadores de setores críticos. Entre as categorias incluídas no texto estão os trabalhadores sazonais de atividades agrícolas.

“No que diz respeito a trabalhadores sazonais, particularmente no setor agrícola, os Estados-membros estão sendo convidados a trocar informações sobre suas diferentes necessidades em nível técnico e a estabelecer procedimentos específicos para garantir uma circulação tranquila para esses trabalhadores para responder à escassez de mão de obra resultante da crise”, afirmou a Comissão Europeia, em comunicado.

Apesar do atual impasse, tanto Hemmerling quanto Lakner descartam, no momento, que a crise possa ocasionar um gargalo no abastecimento.

“A Alemanha produz mais do que consome. Até mesmo em 2018 e 2019, que foram anos difíceis para a agricultura devido à seca, foi produzido mais do que o consumido”, destacou Lakner.

Já uma redução de frutas e legumes nos mercados alemães é um impacto previsto por ambos, se não houver em breve uma solução para a escassez de mão de obra.

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